Histórias de Leves Enganos e Parecenças

Hoje chega por aqui o livro Histórias de Leves Enganos e Parecenças, ele flecha certeiro em nossa alma.

Conceição Evaristo nos transporta para um mundo dos sonhos. Neste mundo narrativo, passado e presente; social e coletivo; corpo e alma; homem e divino; todas as dualidades, que na vida em vigília se tensionam, aqui viram uma só coisa harmônica e pulsante. A escrita de Conceição é pura alquimia. São contos com grande potência para serem usados em nossa prática clínica, são incríveis e envolventes. É, simplesmente, impossível ficar indiferente diante deles.

Trazemos alguns exemplos, em Os pés do dançarino, encontramos um moço muito talentoso que se perde no mundo das aparências e da persona, mas isso tem um custo para sua alma e seus pés. Já Grota funda pode ser visto como uma analogia ao mergulho ao inconsciente ao narrar a mudança na personalidade de Alípio de Sá depois que ele desceu a uma misteriosa gruta que diziam guardar tudo aquilo que não era bem vindo a luz.

A moça de vestido amarelo narra a história de Dóris menina, que às vésperas de sua primeira eucaristia sonhou com uma moça de vestido amarelo! Poxa nem para sonhar com anjos ou com uma santa de manto azul, disseram seus pais! Mas “cada qual sonha com que está guardado no inconsciente. E no inconsciente nem a força do catequismo, da pregação nem as do castigo apagam tudo”. E assim, Dóris e sua avó nos guiam para o reencontro com o divino e o sagrado que existe em nós mesmo que não saibamos, nada pode apagar nossa história e nossa identidade.

O último conto do livro se difere por ser mais longo que os outros. Cerca de metade das páginas desta coletânea foram nos contam a história de Sabela e o dilúvio. Cosmogônico, apocalíptico, único. Tudo começa com uma personagem impressionante, a Mãe Sabela, cuja o corpo fica molhado e seco conforme é o tempo lá fora. Assim ela avisa que uma grande chuva está por vir e, minha gente, caiiiii o mundoooooo. Mas, gente, sério, nem Noé nem arca resistiriam a tanta água.

Tão emblemáticos quanto Sabela Vó e Sabela Mãe, são os demais personagens que encontramos aqui. Madrepia, Rouxinol, Velho Amorescente, Írisverde, Antuntal, Buono, Manascente... Suas histórias e dores são tão familiares que parecem fragmentos de nossa própria alma. Para deles o apocalipse que dizimou e matou tanta gente foi vivido como um momento de batismo, purificação, transformação e renovação. Nessa diversidade somos levados a refletir nossa relação com essa fonte inesgotável dentro de nós. É tão lindo esse conto, tão lindo, que minhas águas escorreram e quase me afoguei em mim enquanto o lia.

Por tudo isso e muito mais, nosso conselho de hoje é: pare tudo que você estiver fazendo e vá redimir, aquecer e umedecer sua alma na escrita alquímica e transformadora de Conceição Evaristo.

dica de @psi.jugi

Histórias de Leves Enganos e Parecenças

Escritora: Conceição Evaristo @conceicaoevaristooficial

Editora: Malê

Texto originalmente publicado em @othalapsi, o nosso Instagram, no dia 3 de agosto de 2020. Passa lá, contamos Os pés do dançarino para você!

#othalaepop #conceicaoevaristo #leiamulheres #leiamulherespretas #contos #contosbrasileiros #criticasocial #inconsciente #alquimia #candoble #umbanda #magia #literaturabrasileira #dicadeleitura #psicologianalitica #cgjung #jung #gepj